Chaim Perelman
Written on 08:57 by fedark9
1.Contextualização
Chaim Perelman foi um expoente da filosofia do direito no século XX, havendo desenvolvido um extenso estudo sobre a retórica, o conceito de justiça, a lógica jurídica, entre outros assuntos que foram abordados por esse homem que em sua obra se contrapôs ao método dominante na época que era o cartesianismo de René Descartes. Nesse imperava a idéia da existência de uma verdade que ao ser descoberta relegaria as opiniões divergentes ao erro, sendo esse uma tentativa de trazer a exatidão e certeza.
Havendo apenas uma verdade de cada coisa, quem quer que a encontre sabe dela tudo o que se pode saber. [...] Pois, enfim, o método que ensina a seguir a verdadeira ordem e a enumerar exatamente todas as circunstâncias do que se procura, contem tudo o que dá certeza às regras da aritmética. (DESCARTES apud CAMARGO, 2003, p.187)[1]
Contrariamente a esse pensamento Perelman não aceita essa idéia de verdade do cartesianismo, para ele existe a opção mais adequada para aquela situação. A racionalidade buscada por ele é voltada para a vida prática, onde as pessoas fazem escolhas e estas são valoradas (como a melhor opção ou não) de acordo com as justificativas que são dadas. Além de trabalhar com os valores que até aquele momento eram tidos como irracionais por não se encaixarem no raciocínio matemático. (CAMARGO, 2003, p.188-189).
Perelman e a Nova Retórica
Retomou os conceitos da dialética e da retórica, que foram bastante difundidos na antiguidade para embasar sua pesquisa. Primeiramente é necessário entender como ambas se desenvolviam naquele tempo. A Dialética foi um método utilizado pelos gregos que através da argumentação e da oposição entre os argumentos procurava-se compreender o fato que naquele momento era discutido e que a contradição entre os argumentos era necessária. Já a Retórica era outro método utilizado pelos pensadores da época que, principalmente os sofistas, que através da exposição de uma idéia, de forma rebuscada e pomposa com o intuito de influenciar os ouvintes. De acordo com Margarida Camargo (2003, p.200- 201)[2] “A primeira trata do processo dialético do diálogo e do confronto entre opiniões, com destaque para a habilidade no manejo entre teses contrárias, e a segunda, do discurso orientado para a arte do bem falar, voltada para a persuasão e para o convencimento”
Partindo destes métodos ele propõe uma nova abordagem para o sistema jurídico. Uma abordagem mais valorativa e argumentativa em que é necessário discutir e avaliar os fatos e as questões preponderantes que cercam o caso a ser estudado. Em que a forma de expor tais idéias e argumentos devem ser analisados. Como também a contraposição dos argumentos. Logo, teríamos uma conclusão mais plausível para o caso analisado.
[...] que interessa à Nova Retórica. Interessa-lhe, antes, a fundamentação racional que justifica o agir humano: por que nos posicionamos de uma forma e não de outra; por que tomamos um tipo de decisão e não outro: por que uma solução se ostra mais adequada do que outra. Para a argumentação que nos interessa, é característico o elemento dialético, ou seja, é fundamental que exista a possibilidade de um contrário em relação ao qual devamos argumentar, senão caímos numa esfera de decisões fúteis, para as quais não existem argumentos, pois o que é fútil é vão; é insignificante. (CAMARGO, 2003, p.202- 203)[3]
Para que tal processo seja efetivado é necessária uma prática diferenciada, uma prática selecionada, para um grupo seleto, em que se jus a presença de um auditório. Mas não um simples conjunto e sim um corpo que durante o processo participe, argumente e interfira nas questões que estão em pauta. Logo, com esta participação e com o desenvolvimento de todo processo a solução mais adequada será encontrada.
O auditório é um dos elementos fundamentais da retórica: é o referencial da retórica. A partir dele, ou para ele, e que o discurso se dirige, e é dele que se procura obter adesão. [...]. O encontro da idéias provocado pela argumentação e pelo convencimento é, para Perelman, o verdadeiro “encontro dos espíritos”. Cabe mais uma vez lembrar que em função de um auditório que a argumentação se desenvolve. Por isso, ela pressupõe a existência de um contato intelectual. (CAMARGO, 2003, p.211-212)[4]
Michel Meyer [5]diz que diferentemente de outros filósofos que buscaram ao longo de seus trabalhos verdades atemporais e impessoais, Perelman “se concentrará em apresentar uma visão do homem, de suas relações com a sociedade e o universo, que seja razoável, aceitável para o auditório universal que ele tenta convencer.”
O conceito de justiça
Segundo Perelman a justiça é algo complexo e não se configura na simples aplicação da lei no caso concreto. Ela possui além de um caráter objetivo, da simples aplicação da lei, possui também um caráter subjetivo valorativo. E que durante o processo não está em discussão apenas a eficácia da lei, mas também a influência dos valores na sociedade. Valores cujo ideal de justiça e equidade estão inseridos e que inevitavelmente influenciam no processo de tomada da decisão justa. (CAMARGO, 2003, p.193-194)[6]
De fato, se o direito é um instrumento flexível e capaz de adaptar-se aos valores considerados prioritários pelo juiz, não será necessário, em tal perspectiva, que o juiz decida em função de diretrizes vindas do governo, mas em função do valores dominantes na sociedade, sendo sua missão conciliar com esses valores as leis e as instituições estabelecidas, de modo que ponha em evidência não apenas a legalidade, mas também o caráter razoável e aceitável de suas decisões. (PERELMAN, 2004, p.200)[7]
A lógica jurídica
De acordo com os ensinamentos de Camargo (2003, p.209- 228) na visão Perelman a lógica jurídica não existia como uma lógica formal e sim como uma ciência que tem por missão analisar o raciocínio jurídico, uma lógica ligada à retórica e à argumentação. Em suma, a lógica jurídica aplica a Nova Retórica ao direito
No lugar da lógica que requer rigor de procedimento para conclusões corretas, a partir da evidência de suas premissas, a lógica que agora se instaura é lógica do preferível àquilo que justificadamente se apresente como mais razoável ou mais adequado para cada situação, ou melhor, para cada problema concreto. (CAMARGO, 2003, p.203)
[1] CAMARGO, Margarida Maria Lacombe. Hermenêutica e Argumentação: Uma Contribuição ao Estudo do Direito. 3ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2003.
[2] Ibidem, p.200-201
[3] Idem, p.202- 203
[4] Idem, p.211- 212
[5]MEYER, Michel. Chaïm Perelman. PET- JUR. Disponível em:<http://www.puc-rio.br/sobrepuc/depto/direito/pet_jur/c1mmeyer.html>Acesso em: 30 out. 2008
[6] CAMARGO, Margarida Maria Lacombe. Op.cit., p.193-194.
[7] PERELMAN, Chaïm. Trad. Vergínia K. Pupi. Lógica Jurídica. 2ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
